Revejamos alguns velhos temas de direito, para melhor colocarmos o problema. Falamos no parágrafo anterior em “efeitos” causados pelas leis no mundo. A esses efeitos damos o nome de eficácia jurídica. Antes de tratarmos da eficácia, convém falar antes em vigência e efetividade. Vigência é o atributo que lhe dá existência, isto é, que a faz entrar no ordenamento jurídico. Normalmente há um prazo para que as leis entrem em vigor (45 dias, consoante art. 1º do Del. 4.657, de 4 de setembro de 1942). É a partir da vigência que as leis passam a ter eficácia, isto é, podem surtir seus efeitos, estão “valendo”. Entretanto, algumas leis, mesmo em vigência, tendo eficácia, não têm efetividade (eficácia social), ou seja, não surtem os efeitos pretendidos pelo legislador, seus destinatários não a seguem, enfim, é quando a lei não “pega”. Uma boa prova disso é a maior parte dos artigos referentes aos crimes contra os costumes no Código Penal brasileiro. Só a título de ilustração, veja-se: “Art. 234 - Fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa” (Del. 2.848, de 7 de dezembro de 1940). Pergunto: algum de vocês já viu alguém sendo detido ou pagando multa por vender uma Playboy? No projeto de lei (art. 5º, do PL 1.679/99) há a previsão de retirada das palavras estrangeiras do nosso idioma, pois estas são “lesivas” ao nosso patrimônio, sendo substituídas por equivalente em português. Assim, não mais haverá self-services, mas vários “auto-serviços”; os shopping centers serão “centros de compras”; a já citada revista masculina deverá chamar-se “indivíduo rico ou que ostenta riqueza, jovem e solteiro, e de vida social intensa”; e o mouse vai virar “dispositivo de entrada dotado de um a três botões, que repousa em uma superfície plana sobre a qual pode ser deslocado, e que, ao ser movimentado, provoca deslocamento análogo de um cursor na tela” (definições do dicionário Houaiss, que, por esse projeto, deverá rever algumas delas, pois “cursor” é um estrangeirismo...). Não precisa ser expert (pelo projeto de lei eu deveria utilizar a palavra “esperto”) para ver que lei não surtirá efeitos pretendidos (eficácia social ou efetividade).
Na justificativa, o deputado afirma que o homem simples do campo não compreende tais palavras... Ora, convenhamos! Qual a pessoa hoje que não sabe o que é um Shopping Center ou um self-service? Pode não saber escrever tais palavras corretamente, como também não saberá escrever as portuguesíssimas “exceção”, “gorjeio” e “obsessão”, por exemplo. Na verdade o projeto tem claro cunho ideológico. Garanto que se fosse o russo, ao invés do inglês norte-americano (consoante se lê na justificativa do projeto) o idioma “invasor”, estaria o deputado querendo colocá-lo na grade curricular das nossas escolas. Um ponto a menos para o Congresso. Daria um ponto a menos para os comunistas, mas esses não mais os têm...
Ah, em tempo: pelo projeto de lei aqui tratado, eu deveria pagar uma multa que variaria entre R$4.256,40 e R$13.833,30... E, em havendo reincidência, esse valor seria dobrado (art. 6º, caput - ops! cabeça - e parágrafo único do PL 1.679/99).