quinta-feira, 15 de maio de 2008

Senhoras e Senhores, Vitorino Silva!

Sempre gostei de livros. Assim que entrei para a antiga Escola Técnica de Pernambuco, virei um rato de biblioteca. Continuei como tal na UFPE, visitanto constantemente a Biblioteca Central, onde encontrei, além de mofo, poeira e ácaros, obras valiosíssimas. Ainda hoje, na UERN, continuo explorando o mais glorioso espaço do saber. Numa destas minhas idas e vindas encontrei o Interpretação e superinterpretação, de Umberto Eco. Nesse livro o italiano defende uma tese interessante: além da idéia que o autor quer passar em seus escritos e a idéia que tem o leitor, mormente díspares, há ainda a intenção do texto.

Bom, mas o que é que isso tem a ver com o título da postagem? Quis criar aqui uma desculpa para, primeiro, apresentar o trabalho de um grande amigo, lá dos idos tempos da Escola Técnica, Vitorino Silva. Vitorino é estudante de Letras lá na UFPE e poeta, por obrigação, pois a poesia não pede, manda. A segunda é escusar-me de apresentar-lhe minha opinião diante de seus textos. Primeiro não tive tempo, como já lhes informei numa postagem anterior, e, segundo, pelo que lhes informei nos parágrafos anteriores: jamais descobrirei o que quis ele dizer e meu sentimento, diante dos poemas, será certamente diverso. Além do mais, se Umberto Eco estiver certo, o texto terá sua própria intenção e aí, amigos, jamais chegaremos a um consenso.

Sem mais delongas, apresento-lhes três poemas dele. Apreciem.

Sem Descanso

Corro
como um rio na chuva
Debalde
Inundo o tempo que me resta
com a perenidade insone da jornada

meu próprio leito me é estrada
e nessa marcha que enebria
me invade
a constante sensação de
curva

Curva que abrevia a visão
Visão distorcida pela chuva
Chuva que inunda a estrada
Estrada que obstrui a vida


Homem Combustível (Crime e Castigo)

Um homem que se propõe a andar na negra fumaça
Não percebe nada além
De sua cegueira e sufocamento

Quando, enfim, por algum motivo, a nuvem passa
Ele traz impregnado na pele o cheiro incendiado
Seu suor, cinzento
sua lágrima, carvão

Quando, no corpo, lhe escorre a água limpa
Aos seus pés, enegrecida,
Evapora em névoa de escuridão.


LISPECTOR

Escutar a palavra estranha,
cinzas de um sentido a mais,
foi finalmente encontrar
a luz que desespera,
o cativeiro que aconchega.

a palavra que é mister tatear,
acostumar-se.
(o talo da rosa no ouvido)
(o dragão chinês no intestino)

“a familiaridade que condena por insistir-se alheia”

a palavra mesmo
que remete a nada
e não precisa se explicar

a matéria bruta do silêncio,
presente, penetrante,
que, quando ignorada,
permanece latente
e sobretudo perpétua.

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